Fizemos esta saída de campo com a equipe do Programa “Esgoto Certo” do Departamento Municipal de Água e Esgotos – DMAE – da Prefeitura de Porto Alegre. O Engenheiro Alessandro, o técnico Clovis e sua equipe apresentam os desafios cotidianos do programa que percorre as ruas da cidade, investigando as conexões entre residências, galerias pluviais, redes de esgoto cloacal, “puxadinhos”, “arremates”, ligações e entupimentos da dinâmica hídrica subterrânea da cidade.
Entendendo o esgoto “certo”
Esgoto pluvial – é a rede de galerias, encanamentos, e arroios (canalizados ou não) que escoam a água da chuva, que contribuem para a boa irrigação do solo, evitando alagamentos, erosão, etc. Ligam-se à residência para escoar a água recolhida nas calhas, nos bueiros, escoadouros, nos gramados, etc.
Esgoto cloacal – é a rede de galerias, encanamentos, que têm a função de levar o esgoto doméstico (das pias, dos vasos sanitários, do ralo do chuveiro) para um sistema de tratamento. Atualmente, o esgoto doméstico que corre ao lado do Dilúvio, na rede cloacal, apesar de ser separado do esgoto pluvial, ainda é lançado no Lago Guaíba, mesmo passando por um primeiro tratamento. Com os novos projetos que envolvem o Programa Socioambiental, o esgoto doméstico será levado até as estações de tratamento na Zona Sul da cidade.
(para mais detalhes, veja a postagem no blog sobre o programa Socioambiental)
Certo e errado na cidadania ambiental
Embora o diagnóstico necessário do esgoto “certo” ou “errado” seja importante do ponto de vista técnico, ele se desdobra em outro procedimento do ponto de vista dos usos cotidianos da água. É a confusão entre os diferentes “saneamentos” em jogo que abre espaço para o entendimento da realidade do ponto de vista socioambiental. Não é uma questão moral que está em jogo na destinação correta dos esgotos (certo ou errado), mas sim uma adesão a uma ética de cidadania ambiental. Do ponto de vista do morador, o esgoto poderia ser simplesmente a água “servida” que ele precisa enviar para fora do seu espaço doméstico. Nossa cultura ocidental elaborou, em um longo processo civilizatório, tecnologias como o próprio sistema de saneamento para retirar da paisagem urbana, remover das preocupações cotidianas, a sujeira. Quem gosta de pensar em sujeira? Quem conversa sobre ela?
A separação entre pluvial e doméstico já diz respeito à compreensão de um sistema de saneamento que pensa os esgotos não mais “fora” do espaço habitado, mas dentro do seu espaço, e de forma constante no tempo – na confluência dos muitos encanamentos que partem de realidades diversas, e que geram, no seu conjunto, um impacto significativo, diário. No espaço público, é responsabilidade dos órgãos governamentais a manutenção (e muitas vezes a instalação) deste sistema. Mas este não é um sistema independente das práticas cotidianas. No espaço doméstico, a responsabilidade de ligar seu saneamento “interno” (os banheiros, os encanamentos, as calhas, etc) a este sistema é do proprietário do imóvel – o que nem sempre condiz com o real usuário da água nesta propriedade (morador que aluga o imóvel, usos comerciais, serviços, etc), nem mesmo com as pessoas encarregadas dos reparos e novas construções no terreno, que muitas vezes modificam ou ampliam as redes internas de saneamento. A compreensão da lógica deste sistema não é o resultado de uma explicação, mas da negociação entre o morador/usuário e os técnicos do Esgoto Certo, que muitas vezes são chamados pelos próprios moradores para resolver problemas de obstrução dos encanamentos, vazamentos, etc. Embora sejam importantes os recursos tecnológicos (os corantes, a microcamera) na descoberta da destinação da água do vaso sanitário, é o contato entre o técnico e o morador que acaba transpondo alguns conceitos de saneamento em um processo de negociação da realidade, em que esses novos limites e caminhos das águas subterrâneas passam a ser imaginados, novas fronteiras entre o espaço público (a rua) e o espaço habitado (a casa), podem ser elaboradas na confluência das águas.
Evidentemente, há casos em que esse diálogo não é possível. Quando esse diálogo não dá resultado, já é outro o dispositivo necessário, o dispositivo legal – multas, processos, etc. E há casos em que nem mesmo é possível o esgoto “certo” – na ausência de infra-estrutura sanitária, como fazer a inclusão do morador em um processo de direitos e responsabilidades, na ética ambiental?
Rafael Devos
3 comentários:
Parabéns Rafael, muito bom. Abraços, Alessandro.
Muito boa a tua explicação Rafael, bastante clara para o usuário, na maioria leigo, do sistema de saneamento básico. Também vivencio esta realidade aqui no Paraná, sou engenheiro da Diretoria de Meio Ambiente e Ação Social – DMA, da Sanepar, que é a companhia de saneamento do Estado. O nosso programa que visa a adequação correta das ligações de esgoto chama-se “Viva a Natureza – Se Ligue na Rede”.
Um abraço e bom trabalho.
Eng. Cartógrafo José Roberto da Conceição
PS. Sou amigo de infância do Alessandro Sippel
Não tinha muito noção do sistema"
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