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quinta-feira, 12 de março de 2009

A lógica hídrica não respeita as divisões por bairros

A lógica hídrica parece não respeitar as divisões por bairros, tão característica de Porto Alegre.
Retornando à campo, fomos até o acesso de pedestres que "deságua" do morro Bom Jesus, costeando uma pequena sanga, na Av. Ipiranga e no Arroio Dilúvio. Na ponta do beco, uma ruelinha dá passagem para o final do morro onde fica o Bairro Bom Jesus e o começo de ruas estreitas e uma grande avenida. Conversamos com alguns moradores, iniciando um contato: - Ah, isso aí não tem solução. - Dizem que vão fazer uma rua aí. Duvido!

Pergunto o nome do lugar, ou da sanga. O arroio/sanga não tem nome, ou pelo menos, era desconhecido de nosso interlocutor. O lugar é o Beco do Albatroz. Pergunto se é recente o beco, reparando em um conjunto de casas recém construídas, a tinta recém pintada, lado a lado ao final do beco. Ele diz que não, que é antiga. O morador fala que a rua que passa mais atrás vai sair na Antônio de Carvalho. Ao fundo das casinhas, vejo um grande condomínio residencial em construção que se enxerga da Avenida Ipiranga. Em frente segue uma larga avenida que sobe o Morro. Pela presença da sanga, imaginamos a água correndo sob esta avenida. O padrão das casas é a “autoconstrução”, ou seja, feita pelo morador, com ajuda de parentes ou vizinhos, em muitos casos. Como foi feito o “saneamento” de cada casa, dentro da autoconstrução? Como aproveitá-lo/transformá-lo para realizar o saneamento do “valão”? Falar da construção da casa pode ser uma forma de chegar em memórias subterrâneas, pluviais. É preciso retomar o contato com esses moradores.

Retornamos após essa conversa, pois nosso tempo de estacionamento já tinha esgotado. Voltamos à Av. Ipiranga contornando a sanga/valo/arroio. O caminho de volta revela o sentido oposto, é como se o pedestre “desaguasse” na via pública, servida por transporte, infra-estrutura urbana, já que os demais pontos de contato do morro com a Avenida Ipiranga são a distante Avenida Antônio de Carvalho, e a Avenida Joaquim Porto Vilanova, próximo às instalações da CEEE. O Beco do Albatroz, a sanga, parecem vestígios de uma antiga geografia e de uma configuração urbana que seguia o curso hídrico. Novamente, percebe-se este como um componente dos itinerários que a canalização do Arroio Dilúvio inaugurou na região. Conforme a antropóloga Teresa Caldeira (na obra “Cidade de Muros” e também em “A Política dos Outros”), o padrão de segregação das cidades brasileiras segue essa lógica da dotação de infra-estrutura urbana (transporte, saneamento, iluminação) para grandes avenidas, promovendo ao mesmo tempo a especulação imobiliária e a ocupação irregular, em novos “vazios” que surgem na paisagem urbana. Escutar a gênese dessas ocupações, nas lembranças de alguns moradores das vilas em torno do Dilúvio, pode apresentar de outra forma o surgimento de bairros e comunidades intimamente ligados ao Arroio Dilúvio. Do outro lado da margem do Dilúvio, é também nesta região que chegam as águas do Arroio Moinho, que divide outro morro entre a Vila São José e a Vila João Pessoa. Mais um dado a investigar.



2 comentários:

Unknown disse...

Parabéns pelo trablaho de pesquisa e ação! Sempre senti falta disso na nossa faculdade.

Hoje sou uma das habitantes do arroio, pois vivo na Vila São Judas Tadeu, que fica entre a PUC, o Sanatório, o Batalhão Ambiental e mais alguns prédios públicos. Atravesso e percorro parte dos seus 17km todos os dias.

O pessoal da Vila, que existe há mais de 5 décadas, brincava no Arroio Moinho, ainda não canalizado, e chegava ao Dilúvio.

Aproveito para passar para vcs o blog da Associação de Moradores da São Judas: http://amovitapoa.blogspot.com/

Abraços para todas/os,
Dani Tolfo

Habitantes do Arroio disse...

Que legal Dani! Vamos combinar uma visita da equipe do projeto à comunidade da São Judas! São os caminhos das águas convergindo mais uma vez!

um abraço!
Rafael.

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